Um
assunto no mínimo inusitado tem tomado conta das redes sociais, aparecido nas
televisões e causado um novo frenesi nos bastidores do mundo cristão, trata-se
da pornografia gospel. A ideia, defendida por um site americano chamado “Sex in Christ”, tem se
espalhado ao redor do mundo e provocado muita polêmica. Os autores do “Sex in
Christ” defendem a criação de um entretenimento adulto para casais cristãos.
Filmes, revistas e outros materiais que possam “melhorar as relações sexuais e
sensuais dos crentes”. Para eles, “a maioria dos guias sexuais cristãos são
vagos ou recatados, omitindo
os detalhes gráficos”.
Nessa
proposta, algumas regras devem ser seguidas: 1) somente casais casados devem
atuar nesses filmes; 2) as cenas devem retratar sexo com um contexto de
casamento cristão; 3) os filmes devem ser instrutivos; 4) marido e mulher devem
estar de acordo; 5) nada de sexo extraconjugal, a não ser para ilustrar as
quedas de adultério; 6) deve ser inspirador para o fortalecimento do casamento
cristão e da sua fé; 7) não deve conter palavrões.
Eu
gostaria muito de ser puro ao ponto de ver pureza nisso tudo. Infelizmente, o
que vejo é muita hipocrisia e, acima de tudo, interesse em um mercado que
movimenta bilhões de dólares todos os anos. A indústria pornográfica se tornou
uma das mais bem remuneradas do mundo e isso é extremamente atrativo para
pseudo-cristãos que querem uma lasquinha desse mercado. Visto que, segundo o
site, já existem cristãos trabalhando na indústria pornô – resta saber se são,
de fato, cristãos.
O
texto do site “Sex in Christ” faz alusão ao livro de Cantares e diz
acertadamente que aquele livro descreve uma relação sensual entre um homem e
sua esposa, mas exagera ao compará-lo com os conteúdos eróticos dos dias de
hoje. E pior ainda, o autor do site foi leviano ao tentar utilizar esse livro
das Escrituras como forma de justificar os interesses particulares de um
mercado multibilionário ou mesmo de uma teologia liberal que não se importa em
distorcer as palavras bíblicas, insistindo em dizer que não existe uma
interpretação da verdade.
Para
entender um pouco melhor. A palavra grega “pornéia” – que, como se
percebe, dá origem a atual palavra pornô – é utilizada biblicamente para
descrever a imoralidade sexual e o faz de tal forma que essa é a palavra
utilizada pelo próprio Jesus Cristo para falar sobre casamentos
irremediavelmente destruídos (Mt 19:9 – em breve posso postar, caso haja
interesse, uma exegese mais profunda desse texto, explicitando o por que ele
está sendo citado aqui). Nesse contexto, o que realmente importa, é que a
palavra “pornéia” é uma alusão clara ao sexo que extrapola os limites da
intimidade conjugal, envolvendo, de qualquer maneira, a participação de
terceiros. O exibicionismo também é uma forma de “pornéia”.
A
pornografia tem gerado vícios ao redor do mundo. Existem milhares, talvez
milhões, de pessoas vivendo na dependência dela, uma verdadeira escravidão que
os impede de trabalhar, de estudar, de cuidar de si e de suas famílias, de ter
uma vida socialmente saudável. Ali são apresentados padrões de beleza e de
desempenho que não são comumente encontrados em casa. Isso, no mínimo, vai
provocar, nos casais que assistirem a esses filmes, o desejo pelos corpos
apresentados nos materiais pornográficos, ou seja, adultério. Jesus afirma que “qualquer
que olhar para uma mulher para desejá-la, já cometeu adultério com ela no seu
coração” (Mt 5:28). Como alguém
vai assistir intencionalmente um casal bonito fazendo sexo publicamente e não
vai desejar? É muita hipocrisia dizer o contrário.
Concordo
que a Igreja precisa falar mais abertamente sobre sexo, que a bíblia deve ser
investigada profundamente para esclarecer as questões sexuais, que a Igreja tem
negligenciado o tema do sexo sem se dar conta do quanto ele é importante para
os tempos atuais. Porém, transformar isso em filmes que apresentem detalhes gráficos, ou seja, que
exiba o ato em si; ultrapassa os limites do bom senso e do amor aos fracos. A
Igreja deve ter, no mínimo, a responsabilidade de não incentivar atitudes que
ponham em risco a saúde física e mental dos seus fieis, bem como tem a
obrigação de evitar o escândalo. A educação sexual em lugar nenhum, nem no meio
secular, é feita a partir de filmes pornográficos, isso é uma sandice, ou
melhor, isso, com certeza, possui ares de uma entre duas possibilidades: 1) uma
teologia liberal extremamente arraigada no coração inconsequente de pessoas que
desejam fazer o bem, mas divagam sem as devidas reflexões; ou, 2) o já
mencionado interesse na multibilionária indústria do sexo.
Gostaria
até de aprofundar mais a questão, no entanto, o texto está ficando muito
grande. Espero que seja suficientemente esclarecedor ou provocativo o
suficiente para se construir uma reflexão mais profunda sobre o tema. Um texto
correlato que escrevi há algum tempo pode ajudar na reflexão, chama-se O
Pornô e a (des)humanização do sujeito.