A palavra “democracia” tem tomado um significado cada vez mais
profundo na chamada “era do conhecimento”. Cada pessoa, nesse mundo
informatizado, – e, para não fugir a minha mania de
neologismos, internetizado – tem a possibilidade de produzir e publicar
os seus próprios conteúdos em uma espécie de universo paralelo que forma outra
realidade em conjunto com o mundo comum. Já não é mais necessário
ficar limitado ao recebimento das produções dos canais convencionais de
comunicação.
A onda da interatividade está tomando conta do mundo, qualquer um
com uma câmera digital na mão, um pouco de criatividade e acesso à Internet
pode ser a nova sensação dos veículos de comunicação do país e até do
mundo. Com pouquíssimas restrições, um mundo quase ilimitado se abre
diante da nova geração, possibilitando a publicação de músicas, filmes,
imagens, textos que, à sua própria forma, comunicam a mensagem livre de cada
indivíduo.
Parece uma fábula que se torna verdade, o sociólogo
Ely Chinoy, no início da década de 1960, já prenunciava que no final do
século XX um adolescente trancado em seu quarto teria acesso a mais informação
e diversão do que um Czar russo podia ter em toda a sua vida no final do século
XIX. Nesse turbilhão de informações, onde a cada dia são postados cerca de
75.000 novos vídeos no YouTube e oito milhões de novos posts na
blogosfera, uma pergunta precisa ser feita: estamos preparados para isso?
O grande problema é que a falta de limites e mesmo de legislações
específicas para o universo cibernético tem conduzido as pessoas a um novo
comportamento social ainda não definido, porém que precisa ser analisado. O
acesso a esse gigantesco mundo de conteúdos requer a formação de uma
consciência normativa que indique os caminhos que se deve tomar para a
construção do que está por vir.
A democracia verdadeira não se forma apenas dando acesso ao espaço
público, mas principalmente formando pessoas capazes de contribuir com ele. Não
se trata de mera instrução técnica, mas de educação no sentido mais profundo e
amplo da palavra. Os indivíduos desejam reconhecimento de suas habilidades, dos
seus talentos, dos seus projetos, em fim, de sua persona; querem se apresentar
ao mundo mostrando aquilo que lhes abriria espaço para uma efetiva participação
na vida pública. Porém, esse projeto individual, ou mesmo individualista, de
“mostrar-se ao mundo” escapa, em grande parte das vezes, a qualquer senso de
participação social. O ser do outro tem sido frequentemente esquecido, ou pior,
ignorado, no projeto de reconhecimento individual.
Ou seja, a despreocupação com a qualidade e com as consequências
dos conteúdos postados na Internet é uma atitude de dessocialização – definindo
dessocialização como o extremo oposto da socialização. A Internet, que deveria
ser um espaço de construção social, tem se tornado, cada vez mais, local de
individualização do sujeito, marcada por desrespeito e descompromisso social.
Conteúdos elaborados com o intuito de ridicularizar pessoas, de transferir
ódio, de manipular situações, sem falar das pornografias e pornofonias, são
elementos de separação social cada vez mais presentes na rede. E como
se não bastasse, esse tipo de conteúdo ocupa sempre os tops das
mídias sociais.
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