Uma
parcela significativa da população mundial enfrenta, nos dias atuais, terríveis
problemas com guerras, perseguições políticas, escassez de alimentos e falta de
condições mínimas de bem-estar social, dentre outros. Esses problemas têm
gerado o maior fluxo migratório entre nações de todo o mundo desde a II Guerra
Mundial. A Europa, por exemplo, tem recebido migrantes da África, da Ásia e de
países europeus que estão fora da Zona do Euro. Aqui, nas Américas, o problema,
também, tem se agigantado. Todos os anos, um número incalculável de pessoas
tenta migrar, legal ou ilegalmente, para países com imagem mais positiva no que
diz respeito à qualidade de vida.
Essa
situação, que carece de solução urgente, é motivo de discussões amplas,
abrangendo temas como relações internacionais, economia regional, religião, justiça,
solidariedade, hospitalidade entre os povos, bem-estar social e muito mais. No
meio de toda essa discussão, a grande novidade é a recente abertura das
fronteiras alemãs para o acolhimento dos migrantes, principalmente os oriundos
da Síria. Os germânicos, desde o III Reich, realmente, modificaram os seus
conceitos sobre hospitalidade e tolerância entre os povos. Isso pode ser
percebido na prática, pois a população daquele país saiu às ruas com donativos
e cartazes de boas vindas para acolher os recém-chegados.
A
grande questão é: se a atitude dos alemães no que diz respeito à solidariedade,
cosmopolitismo e hospitalidade universal são dignas de imitação, será que as
questões econômicas e sociais que emergem dessa mesma atitude são suportáveis
pelos países que abrem suas fronteiras para a imigração nessas condições? Simplificando,
trata-se de uma redução do problema ao fator econômico. De um ponto de vista
moral, essa redução é abominável, não se pode deixar pessoas privadas de
direitos e condições fundamentais para a vida só por causa do argumento de
redução da riqueza daqueles que normalmente têm mais do que precisam ter. Mas, infelizmente,
não temos como negar que o fator econômico é preponderante, pois as implicações
vão desde sacrifícios individuais para a população recebedora até a
possibilidade da emergência de grandes problemas sociais como bolsões de
pobreza, aumento da violência, redução da renda média, etc.
Como,
então, conciliar interesses tão radicalmente diferentes? Bem, essa é uma
questão da física, todo fluxo tem um sentido de corrente, ou seja, tem origem e
destino. Assim, a questão da migração precisa ser pensada nesses dois pontos:
1) na origem, criando condições de bem-estar social suficientes para a
satisfação das pessoas com a sua terra natal. Isso implica em promover as
condições básicas de desenvolvimento socioeconômico, referidas, por exemplo, no
trabalho de Amarty Sen, que atendem em especial as necessidades individuais; e,
2) na acolhida, os países que acolhem os migrantes de regiões menos
privilegiadas devem inserir esses novos moradores no processo de produção de
riquezas da nação, evitando assim os problemas que costumam emergir do aumento
drástico do tamanho da população sem o devido acompanhamento do crescimento econômico.
Claro,
olhando assim, parece simplismo. Mas, longe de imaginar que resolvi o problema
da terra em uma página, chamo a atenção para o fato de que essa é uma discussão
que data de Platão e Aristóteles e vem se arrastando por milênios. Produzindo,
portanto, em termos teóricos e pragmáticos, soluções aplicáveis, muitas delas
já testadas para se resolver esse problema. Veja-se que quando esse mesmo
problema ocorreu durante e após a II Guerra Mundial, a Europa não apenas
resolveu o problema como cresceu em qualidade de vida. Nesse texto, a primeira parte
da proposição que eu apresentei está centrada na origem, isto é, na
reorganização política dos países onde o fluxo se origina. Essa teoria é
oriunda do pensamento do filósofo alemão Immanuel Kant, precisamente do seu texto
intitulado A Paz Perpétua. Já a segunda parte está alinhada com o pensamento de
John Rawls, contida em sua obra Uma Teoria de Justiça, principalmente no
Princípio da Diferença proposto no Capítulo II da obra e a reflexão sobre as
Parcelas Distributivas (Capítulo IV).
Bem caro amigo, o que quero dizer nesse texto é que não podemos imaginar um mundo com fronteiras fechadas para a solidariedade, para a hospitalidade e, principalmente, para o cosmopolitismo. É inimaginável, do ponto de vista ético, cristão, ou de qualquer religião, que pessoas estejam sobrevivendo sem as condições mínimas em regiões com pouco, ou nenhum, desenvolvimento econômico, enquanto, em outro lugares, pessoas vivem de maneira opulenta, negando ajuda aos primeiros. Com certeza, a solução não está nesse texto. Aqui, eu quero apenas levantar uma esperançosa discussão sobre a necessidade de um projeto político mais humano para o problema dos povos excluídos.