O
brasileiro se alimenta do imediatismo! Faço essa afirmação com o desejo de
denunciar a forma passiva e irrefletida que modela as interpretações que o
nosso povo faz acerca de sua própria condição social. Na semana passada, para
citar um exemplo prático, foi divulgada mais uma pesquisa sobre a popularidade
da presidente Dilma Rousseff, uma aprovação altíssima do seu governo foi
apontada pelos brasileiros. Até aí tudo bem, o que acho estranho nessa pesquisa
é que as pessoas que deram quase 90% de aprovação a esse governo classificaram,
na mesma consulta, a educação e a saúde brasileiras como péssimas. Como isso é
possível? Como é ótimo um governo em que a educação e a saúde são péssimas?
A
resposta não é simples, tem muitas variáveis, mas, no meu ponto de vista, a
passividade imediatista do brasileiro, isto é, esse contentamento com migalhas,
é fator crucial para essa apatia política que observamos. Os pobres estão
contentes com as bolsas, não se preocupam com o seu desenvolvimento, não olham
para o futuro, querem apenas um pouco de dinheiro agora, não exigem nada que
mude suas perspectivas. A classe média está imensamente feliz com o crédito
fácil, comprando e comprando. Sem perceber o achatamento do seu poder
aquisitivo, antecipa os seus desejos e se envolve em dívidas cada vez maiores
(a classe média tem o maior endividamento da história, em média 41% dos
rendimentos mensais comprometidos com dívidas acima de 12 meses, a maior
inadimplência de todos os tempos, 25% das pessoas que possuem cartões de
crédito estão com atrasos superiores a três meses – dados do IPEA e IBGE,
divulgados em 10/07/12 pela Globo News). Os ricos, por sua vez, são
constantemente favorecidos por programas de incentivo ao consumo que reduzem
temporariamente os impactos da crise financeira internacional e alimentam os
bolsos dos mais abastados. Além disso, o PAC (Programa de Aceleração do
Crescimento) que não apresenta nenhuma proposta de longo prazo, nem nenhum
favorecimento real à indústria nacional, abre caminho para a corrupção em todo
o país. Ou seja, todos estão, de alguma maneira, contentes, estupidamente
felizes. Por isso, ninguém reclama de nada.
Acontece
que o crescimento de médio e longo prazo do Brasil está seriamente comprometido
pela falta daqueles dois pontos que os brasileiros negligenciaram ao dar sua
opinião sobre o atual governo, educação e saúde. Basta refletir sobre outra
questão prática, como é que em um país que possui 16 milhões de desempregados
pode sobrar 100 mil vagas apenas no setor de tecnologia da informação e
comunicação e outras cinquenta mil nas áreas de indústria e serviços? A
resposta está na falta de educação e de condições sociais de trabalho. O
capital disponível para investimento de longo prazo ao redor do mundo cresceu
5% em relação a 2011, alcançando a marca de 1,6 trilhões de dólares. No
entanto, segundo o Banco Mundial, a intensão de aplicação no Brasil caiu 19%. A
justificativa dos investidores internacionais está centrada na falta de: 1)
ambiente institucional e regulatório adequado, ou seja, política econômica e
poder judiciário confiáveis; 2) infraestrutura compatível com as projeções de
crescimento econômico e, 3) educação em nível técnico e superior que possam
prover o mercado de mão de obra suficientemente qualificada para o atendimento
das demandas das empresas.
A
cegueira em relação à educação é o que mais me impressiona, como se pode deixar
de perceber que a sustentabilidade do progresso econômico que o Brasil está
experimentando hoje depende essencialmente da qualificação profissional e das
projeções analíticas das ciências sociais? É necessário que o Brasil invista em
programa de educação de alto nível, que ofereça vagas suficientes para a
população em todos os níveis educacionais, que desenvolva um tipo de assistencialismo
que transforme os desvalidos em pessoas qualificadas para o trabalho e para a
reflexão social. Sem isso, o país continuará amargando a desigualdade social e
baixos índices de desenvolvimento por muito tempo. Veja que os programas de
restauração da Alemanha e do Japão, dois países destruídos na Segunda Guerra
Mundial, foram alicerçados no desenvolvimento massivo da educação. Quando falo
de desenvolvimento massivo, falo que esses países desenvolveram instituições de
ensino e valorizaram o seu corpo docente ao ponto de se tornarem referências
mundiais. Aqui, dou uma alfinetada no programa Brasil sem Fronteiras, que é
maravilhoso, mas precisa ser acompanhado de um desenvolvimento do sistema
educacional no Brasil, não dá para ficar dependendo da formação no exterior.
Enfim,
precisamos de certo pessimismo para poder desenvolver. Sim, precisamos de
pessimismo para sair do canto, para nos mover, esse excesso de otimismo está
matando o nosso país. Está na hora de desacreditar, está na hora de contestar o
futuro da nossa nação e de oferecer às próximas gerações um futuro planejado.
Isso só será possível se houver investimentos reais na educação brasileira.
Para se ter uma ideia, o Brasil, por incrível que pareça, no início dos anos
1990, destinava 6,5% dos seu PIB para a educação, este percentual caiu para
4,1% no atual governo. Em 1994, o então presidente da república, FHC, um dos
principais responsáveis pela desvalorização do profissional educador, vetou um
projeto que colocaria 7% do PIB a disposição da educação no Brasil, esse
projeto incluía aumentos progressivos do investimento até atingir 10%. Quando
Lula assumiu o governo em 2002, infelizmente, manteve o veto e Dilma
acompanhou. Lá se vão 18 anos de atraso nos investimentos para um
desenvolvimento realmente sustentável do nosso Brasil.
Espero
que com um pouco de pessimismo, ou seja, prestando mais atenção ao que
realmente está acontecendo, o brasileiro consiga mudar esse quadro e se
qualificar para participar efetivamente do seu futuro.
Um comentário:
O imediatismo combinado ao consumismo desenfreado, que nesses últimos tempos vem saltando aos olhos com baixas de juros e de IPI, só me remete a uma comparação: voltamos à época da política do pão e circo. As migalhas dadas pelo governo (como muito bem foi citado) em nada resolvem esse grande déficit educacional e de falta de qualificação, muito menos esses incentivos do governo resolvem o problema da nossa classe média. É... enquanto não olharmos para o futuro com a consciência de que educação é a solução do nosso problema, viveremos tapando buracos e fazendo emendas.
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