segunda-feira, 9 de julho de 2012

Imediatismo Crônico

O brasileiro se alimenta do imediatismo! Faço essa afirmação com o desejo de denunciar a forma passiva e irrefletida que modela as interpretações que o nosso povo faz acerca de sua própria condição social. Na semana passada, para citar um exemplo prático, foi divulgada mais uma pesquisa sobre a popularidade da presidente Dilma Rousseff, uma aprovação altíssima do seu governo foi apontada pelos brasileiros. Até aí tudo bem, o que acho estranho nessa pesquisa é que as pessoas que deram quase 90% de aprovação a esse governo classificaram, na mesma consulta, a educação e a saúde brasileiras como péssimas. Como isso é possível? Como é ótimo um governo em que a educação e a saúde são péssimas?
A resposta não é simples, tem muitas variáveis, mas, no meu ponto de vista, a passividade imediatista do brasileiro, isto é, esse contentamento com migalhas, é fator crucial para essa apatia política que observamos. Os pobres estão contentes com as bolsas, não se preocupam com o seu desenvolvimento, não olham para o futuro, querem apenas um pouco de dinheiro agora, não exigem nada que mude suas perspectivas. A classe média está imensamente feliz com o crédito fácil, comprando e comprando. Sem perceber o achatamento do seu poder aquisitivo, antecipa os seus desejos e se envolve em dívidas cada vez maiores (a classe média tem o maior endividamento da história, em média 41% dos rendimentos mensais comprometidos com dívidas acima de 12 meses, a maior inadimplência de todos os tempos, 25% das pessoas que possuem cartões de crédito estão com atrasos superiores a três meses – dados do IPEA e IBGE, divulgados em 10/07/12 pela Globo News). Os ricos, por sua vez, são constantemente favorecidos por programas de incentivo ao consumo que reduzem temporariamente os impactos da crise financeira internacional e alimentam os bolsos dos mais abastados. Além disso, o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) que não apresenta nenhuma proposta de longo prazo, nem nenhum favorecimento real à indústria nacional, abre caminho para a corrupção em todo o país. Ou seja, todos estão, de alguma maneira, contentes, estupidamente felizes. Por isso, ninguém reclama de nada.
Acontece que o crescimento de médio e longo prazo do Brasil está seriamente comprometido pela falta daqueles dois pontos que os brasileiros negligenciaram ao dar sua opinião sobre o atual governo, educação e saúde. Basta refletir sobre outra questão prática, como é que em um país que possui 16 milhões de desempregados pode sobrar 100 mil vagas apenas no setor de tecnologia da informação e comunicação e outras cinquenta mil nas áreas de indústria e serviços? A resposta está na falta de educação e de condições sociais de trabalho. O capital disponível para investimento de longo prazo ao redor do mundo cresceu 5% em relação a 2011, alcançando a marca de 1,6 trilhões de dólares. No entanto, segundo o Banco Mundial, a intensão de aplicação no Brasil caiu 19%. A justificativa dos investidores internacionais está centrada na falta de: 1) ambiente institucional e regulatório adequado, ou seja, política econômica e poder judiciário confiáveis; 2) infraestrutura compatível com as projeções de crescimento econômico e, 3) educação em nível técnico e superior que possam prover o mercado de mão de obra suficientemente qualificada para o atendimento das demandas das empresas.
A cegueira em relação à educação é o que mais me impressiona, como se pode deixar de perceber que a sustentabilidade do progresso econômico que o Brasil está experimentando hoje depende essencialmente da qualificação profissional e das projeções analíticas das ciências sociais? É necessário que o Brasil invista em programa de educação de alto nível, que ofereça vagas suficientes para a população em todos os níveis educacionais, que desenvolva um tipo de assistencialismo que transforme os desvalidos em pessoas qualificadas para o trabalho e para a reflexão social. Sem isso, o país continuará amargando a desigualdade social e baixos índices de desenvolvimento por muito tempo. Veja que os programas de restauração da Alemanha e do Japão, dois países destruídos na Segunda Guerra Mundial, foram alicerçados no desenvolvimento massivo da educação. Quando falo de desenvolvimento massivo, falo que esses países desenvolveram instituições de ensino e valorizaram o seu corpo docente ao ponto de se tornarem referências mundiais. Aqui, dou uma alfinetada no programa Brasil sem Fronteiras, que é maravilhoso, mas precisa ser acompanhado de um desenvolvimento do sistema educacional no Brasil, não dá para ficar dependendo da formação no exterior.
Enfim, precisamos de certo pessimismo para poder desenvolver. Sim, precisamos de pessimismo para sair do canto, para nos mover, esse excesso de otimismo está matando o nosso país. Está na hora de desacreditar, está na hora de contestar o futuro da nossa nação e de oferecer às próximas gerações um futuro planejado. Isso só será possível se houver investimentos reais na educação brasileira. Para se ter uma ideia, o Brasil, por incrível que pareça, no início dos anos 1990, destinava 6,5% dos seu PIB para a educação, este percentual caiu para 4,1% no atual governo. Em 1994, o então presidente da república, FHC, um dos principais responsáveis pela desvalorização do profissional educador, vetou um projeto que colocaria 7% do PIB a disposição da educação no Brasil, esse projeto incluía aumentos progressivos do investimento até atingir 10%. Quando Lula assumiu o governo em 2002, infelizmente, manteve o veto e Dilma acompanhou. Lá se vão 18 anos de atraso nos investimentos para um desenvolvimento realmente sustentável do nosso Brasil.
Espero que com um pouco de pessimismo, ou seja, prestando mais atenção ao que realmente está acontecendo, o brasileiro consiga mudar esse quadro e se qualificar para participar efetivamente do seu futuro.


Um comentário:

Iara Paula disse...

O imediatismo combinado ao consumismo desenfreado, que nesses últimos tempos vem saltando aos olhos com baixas de juros e de IPI, só me remete a uma comparação: voltamos à época da política do pão e circo. As migalhas dadas pelo governo (como muito bem foi citado) em nada resolvem esse grande déficit educacional e de falta de qualificação, muito menos esses incentivos do governo resolvem o problema da nossa classe média. É... enquanto não olharmos para o futuro com a consciência de que educação é a solução do nosso problema, viveremos tapando buracos e fazendo emendas.